segunda-feira, 22 de março de 2010

Descoberta

A miragem de uma ponte,
Na aragem de um leito seco,
Rasgou as solas,
Impregnadas de vazios.

As sombras de um mal incalculável,
Sempre antes descartável
Como inexistente
Criaram o que nenhuma crença urdia...
Tanta infâmia,
Na insolência que sorria
À própria hipocrisia.

Ego ejaculando
No sádico edifício
Do canto devasso
Enganando incautos.

A abelha não merecia
Ser ferrada
Pela tarantula
Que engoliu a cotovia.

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Asas e Desasas

Aconteceu...

Ela entrou entusiasmada,
Ele a despindo dizia o que queria,
Delicadamente a roçou de setim.

Ele descobria todos os cantos desse corpo,
Por meses a fio perfurou aquela alma,
Falando de espinhos e alecrim.

Ela por vezes chorava desconforto,
Ele lhe dava ânimo com ressalva.
E prometia...

Ele respingava pingos multicores
Que escorriam pelas alvas paredes
Descolando o chão.

Ela nele via o diamante dentro do carvão
A borboleta ainda lagarta,
O pincel de uma obra prima.

Chegou o dia esperado; ele sorria...
Ela cansada daquela cama
Sonhava descansar noutro lugar.

Levantou-se caminhando lentamente
Para ver o seu reflexo na alma do bem amado.
O grito de horror lhe saíu da medula, da alma, do ventre...

Caricatura de demônios
Urdidos na alma distorcida de um temor
Capaz de abortar a própria vida.

Ela tomou banho com palha de aço,
Areia, e água raz.
Abriu o cano do gaz.

Ela, modelara pensando ser a inspiração do belo,
Mas fora do mais cínico pintor o retrato do horror.
A tela ainda ardia quando a polícia chorou desprevenida...

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Asas e Desasas

De Carlos Drummond de Andrade

Do livro Sentimento do Mundo

"... Enquanto fugimos para outros mundos,
que esse está velho...
palácio em ruínas, ervas crescendo,
lagarta mole que escreves a história:
o chão está verde de lagartas mortas..."

As borboletas não nascem nesse mundo...